Este blog não aderiu ao Novo Acordo Ortográfico!

terça-feira, 28 de janeiro de 2014

A Propósito das Praxes...

Nos últimos dias tem-se ouvido de tudo um pouco acerca das praxes, devido à tragédia do Meco. Ainda hoje encontrei um post num blog publicitado na página da sapo (não me recordo o nome) em que alguém partilhava a sua própria experiência dos tempos de estudante. Como tal, gostaria de deixar também a minha opinião(que não passa disso - apenas a minha opinião).

Há uns dias quase fui crucificada por ter dito que fui praxada e gostei. E isto vindo de uma pessoa que nunca pôs os pés numa universidade. Também não admira, pois a única coisa que conhece de praxes, é o que vê na televisão e aí só mostram o que de pior houver para mostrar. Fui tratada como se pelo facto de ter gostado do meu tempo de praxes, tivesse feito sei lá o que... Mas também tenho que dizer que, no meu caso a praxe não foi assim tão má. Não gostei de ter sido obrigada a limpar uma cozinha imunda, juntamente com as minhas colegas. Os "Senhores Estudantes", que é como são chamados os alunos de terceiro ano em Évora, até foram simpáticos e encheram uma mesa com enchidos, queijo, pão e outras coisas para podermos lanchar à vontade depois da maldita faxina. Mas eu estava tão farta e tão zangada de ser obrigada a limpar a porcaria dos outros que preferi não comer nada só para que o tempo passasse mais depressa e me deixassem ir para casa. Vá lá, não me obrigaram a comer! Foi o meu primeiro dia de praxes e não estava a ser fácil. E sinceramente, limpar a badalhoquice dos outros (ainda que a badalhoquice esteja lá de propósito), não é praxe não é nada...

Com o passar dos dias foi sendo mais fácil. Já começávamos a conhecer os senhores estudantes e já percebemos melhor quando estavam a brincar connosco. Nunca nenhum foi incorrecto e felizmente fomos praxados quase só por rapazes. Sim, isto é bom porque nos safámos dos berros e dos castigos estúpidos que as raparigas gostam de dar. Enfim... Fazíamos jogos, guerras de cursos (que ganhámos várias vezes, mesmo sendo uma turma de cerca de 10 pessoas!), jantares de convívio. Também bebíamos mas nunca me obrigaram a nada e não deixavam ninguém ficar bêbado. Quem é que no seu perfeito juízo quer aturar gaiatos bêbados?? É do pior que há...

Mas é verdade que vi muita coisa e nem toda a gente que praxe devia ser autorizado a fazê-lo. Para muitos, praxar é uma forma de humilhar e descarregar as próprias frustrações nos outros. No meu segundo ano, por exemplo, lembro-me que houve uma altura que choveu imenso e os jardins de Évora estavam cheios de poças de água. Uma delícia para quem praxa. Um dia, ia eu a passar perto do pólo do Espírito Santo e vinha um grupo de estudantes com os seus bichos e de repente, uma das estudantes vinha zangada com alguma coisa, puxou de três bichos e obrigou-os a saltar dentro de uma poça e só depois ir embora. Dois deles saltaram e calaram, mas a terceira rapariga recusou-se muito acanhadamente e disse "Mas Senhora Estudante, só tenho estes ténis e não os vou conseguir secar com este tempo. Não posso andar com os ténis molhados a semana toda..." Acham que isto tocou o coração daquela besta? Ficou histérica e só se calou quando a rapariga saltou lá pra dentro da poça. Isto revoltou-me tanto... Mas estava no segundo ano, não sabia assim tanto de praxes e fiquei calada. Ainda hoje me arrependo. 

Por muito que se diga que nas praxes ninguém é obrigado a nada, realmente não é bem assim porque há sempre quem goste de insistir ou começar com gozos ou insultos... Só alguém com uma personalidade muito forte consegue impor-se... Muitas vezes são obrigados a se declarar anti-praxe e ficam banidos de tudo o que é tradição académica. Incluindo queimar as fitas, que na verdade, mais do que um dia especial para um estudante, é um dia especial para os seus pais que vêm com orgulho o dia em que os filhos são licenciados. E é uma cambada de gente parva que se acha no direito de dizer "não queres ser praxado, então daqui a  anos também não podes queimar". Isto não faz sentido nenhum, a meu ver. Julgo que bastava que fossem proibidos de praxar. Afinal também é preciso muita lata para alguém que nunca quis ser praxado, depois andar a praxar os outros.

A parte da integração é verdade. Pelo menos no caso da minha turma, foi. Talvez por nos termos visto todos em situações embaraçosas, ridículas ou mesmo quando alguém perdia o controlo e começava a chorar, lá estávamos todos a apoiar-nos e acabámos por nos tornar um grupo bem porreiro. Houve ainda uma colega que se recusou sempre a ser praxada e inventava desculpas todos os dias para fugir às praxes e acabou por ter mais dificuldade em integrar-se. Não digo que a praxe seja obrigatória para uma pessoa se integrar, mas a verdade é que ajuda. E refiro isto, principalmente pelo que aconteceu   anos depois, quando foi a nossa vez de praxar. 

Como já referi a nossa turma era pequena, mas calharam-nos duas turmas de primeiro ano para praxar. Juntámo-nos e planeámos os jogos, os fatos de praxe, criámos canções que ainda hoje recordo tão bem, organizámos jantares nas casas uns dos outros com os bichos, estudávamos os horários das aulas (deles e nossos - ninguém faltava a aulas e se fosse preciso, faltávamos nós e nunca os bichos) para podermos praxar. Tudo isto saiu dos nossos bolsos, nunca um aluno de primeiro ano contribuiu para o que fosse durante o tempo de praxes, tal como fizeram connosco. Mas a dita colega, e mais uma amiga, quase nunca se juntavam a nós nem perguntavam se queríamos ajuda com alguma coisa nem nada.Uma noite, depois de termos alimentado os bichos, fomos dar uma volta com eles pela cidade para "conhecerem as capelinhas". Tínhamos poucos bichos naquela noite. De noite não há praxes e todos estão mais descontraídos e a tentar conviver, mas deve haver alguma cordialidade entre bichos e senhores estudantes. Qual não é o nosso espanto quando chegamos a um bar e estão as nossas colegas numa mesa com uma data de bichos que ainda mal as tinham visto nas praxes, a pagar-lhes bebidas, a fazer praxes soft e a dar "hi5's" aos bichos...

E qual não foi o nosso espanto quando no dia da escolha dos padrinhos, as meninas se puseram na escadaria do Espírito Santo, e tiveram mais afilhados do que qualquer um de nós (que estivemos com eles todos os dias, que lhes pagámos jantares, que os acompanhámos a todos os sítios que eles precisavam e não sabiam onde era, que lhes mostrámos a universidade e a cidade de uma ponta à outra...). Foi revoltante...

Isto das praxes tem muito, muito que se lhe diga. Compreendo perfeitamente quem é contra, porque vi muita coisa que me revoltou bastante. Mas também há exemplos bons, em que em vez de andarmos a berrar e humilhar as pessoas, tentámos conhecer-nos em modo de brincadeira. Os exemplos contam e o facto de termos sido praxados por uma boa equipa fez com que o fizéssemos da melhor forma. E realmente não devemos ter feito um mau trabalho, já que ao longo dos anos que passaram estudávamos todos juntos e estávamos constantemente a dar apontamentos ou ajudar em alguma disciplina ou mesmo a partilhar histórias de algum professor. Quando as coisas são bem feitas, vale a pena. É triste que nem sempre seja assim...

Sem comentários:

Enviar um comentário

Os comentários são sujeitos a moderação. Seja construtivo :)